Votos de Mulher – Dora Incontri.

by Fátima Regina Saldanha

Votos de mulher

Não quero flores
Porque elas ainda tem sangue.
Não quero amores
Que me deixem exangue.

Não quero migalha
De direito torto.
Quero igual salário
A quem, como eu,
Em dobro trabalha.

Não quero assédio
Nem feminicídio.
Nem olhar promíscuo
De homem médio.
Não quero o tédio
De outro ego arisco
Sobre minha dor,
Sem nenhum remédio.

Quero-me inteira
Gorda, magra ou virgem,
Ou puta alvissareira,
Casada, amante ou solteira,
Ou casta monja à beira.
Quero-me alma prazenteira
E corpo ao meu gosto
Sem desgosto imposto
Sem forma embusteira.

Quero-me mãe, irmã, companheira,
Às vezes terna, às vezes guerreira,
Resistência e não mais
A boneca faceira
Que se faz brincadeira
De um homem capataz.

Irmãs, nossa é a luta
Que não disputa
O poder do poder
O poder de ter.
Nossa é a luta
De poder ser.

Irmãs, nossa é a labuta
Por mais escuta
De qualquer padecer.
Seja-nos esta vida enxuta
De lágrima e sangue.
E jamais se faça curta
Pela força bruta
De uma insana gangue.

Irmãos, aqui estamos
Irmãs e mães, amores e filhas…
Não queremos guerrilhas
Nem fugirmos todas às ilhas
Em que as Safos se escondem.
Reine entre nós serena amizade,
Parceria, respeito e igualdade.
Nenhuma voz jamais seja calada.
Só isso. E mais nada.

Dora Incontri

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